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Qual é o principal entrave à lucratividade da pecuária no Brasil? Pode-se listar, facilmente, a degradação de pastagens, o baixo investimento em genética ou a falta de suplementação do rebanho, mas a resposta correta está na má gestão ou na ausência dela, já que muitas fazendas sequer têm dados para análise de resultados. A gestão move o ponteiro da produtividade, orienta a tomada de decisões e garante a sobrevivência do negócio. Essa é a conclusão do Projeto Fazenda Nota 10, conduzido pela JBS, em parceria com o Instituto de Métricas Agropecuárias (Inttegra), de Maringá, PR.

Lançado experimentalmente na safra 2017/2018, com participação de 10 produtores do Mato Grosso do Sul, o programa já se encontra consolidado, encerrando, no próximo mês de junho, seu primeiro ciclo 100% on-line, com lançamento de dados, aulas e reuniões feitas somente pela internet, o que permitiu sua execução em maior escala, aberta a produtores de qualquer região do Brasil. Na análise parcial da safra 2020/2021, que conta com 107 participantes, já se registrou aumento de 15% no ganho médio diário e 23% na lotação, além de redução de 9% no desembolso por arroba produzida, em comparação com o diagnóstico inicial. “É um resultado excelente, que muita gente demora anos para conseguir”, ressalta Antônio Chaker, coordenador do Inttegra.

Devido ao sucesso da versão on-line, a JBS decidiu ampliar o programa. Novas vagas foram abertas e cerca de 300 produtores já se inscreveram para a safra 2021/2022. “Nossa meta é chegar a 500 até o final de junho”, informa Fábio Dias, gerente de relacionamento com pecuaristas da JBS e idealizador do Fazenda Nota 10, executado, nos três primeiros anos, pela Terra Consultoria (quando se fazia visitas às fazendas) e hoje totalmente a cargo do Inttegra, que armazena os dados em sua Plataforma de Gestão Resulta. A JBS subsidia boa parte dos custos do programa, cabendo ao produtor pagar uma mensalidade de R$ 304.

Requisitos e histórico

 Para participar, é preciso ter balança na fazenda, designar uma pessoa para fazer o lançamento dos dados na Plataforma Resultta, pagar a mensalidade e ser fornecedor da JBS (quem não for, pode se cadastrar). Não há restrição quanto à atividade pecuária da fazenda (ciclo completo, cria ou recria/engorda) e nem obrigatoriedade de venda de animais à empresa. O programa tem duração de 12 meses, mas o produtor pode desligar-se a qualquer momento ou continuar no ano seguinte, buscando evolução contínua. Se a pessoa não participar das reuniões ou deixar de lançar os dados, pode ser retirada do programa, pois um dos principais objetivos do Fazenda Nota 10 é gerar indicadores e estes exigem números. “Após o diagnóstico da fazenda, o participante é treinado para coletar e lançar na plataforma todos os dados necessários à geração dos indicadores. Isso permite ao produtor trabalhar com metas, fazer análise de desempenho interno e comparar-se com o grupo (benchmarking)”, explica Chaker.

A ideia do Projeto Fazenda Nota 10 começou a nascer em 2016, quando a JBS fez uma pesquisa sobre o perfil de seus fornecedores. “Entrevistamos mais de 500 pecuaristas e constatamos que 82% administram pessoalmente a propriedade; têm 50 anos de idade, em média; estão na mesma fazenda há pelo menos 11 anos e não saem muito dela. Temos um cadastro de mais de 50.000 pecuaristas, 30.000 deles nos vendem gado, mas um grupo de cerca de 5.000 fornece 80% de toda a nossa matéria prima. Destes, algumas centenas de grandes nos garantem 40% da produção. Os outros 60% vêm de 4.500 produtores de médio a pequeno porte, que vendem entre 300 e 500 bois por ano, cuidam da fazenda sozinhos e não têm apoio de gestão. Foi para eles que criamos o programa”, conta Fábio Dias.

Segundo ele, a maioria dos pecuaristas trabalha pouco com números, age de forma mais empírica, seguindo a tradição e o treinamento recebido dentro da família. “Em função disso, começamos o projeto no esquema de consultoria tradicional, com técnicos visitando as propriedades, orientando os produtores na coleta de dados e outras questões”, explica Dias. “O programa deu super certo; foi levado para outros locais, como Lins, em São Paulo; chegamos a atender 30 fazendas presencialmente, mas vimos que não daria para ampliar muito o número de participantes. Seria necessário montar uma equipe técnica grande, com altos custos de deslocamento. Decidimos, então, avaliar o formato on-line, ainda em 2019”, acrescenta Chaker. No ano passado, veio a pandemia, que acelerou o processo de digitalização. Hoje, todo o trabalho é feito pela internet e celular, incluindo o monitoramento do lançamento dos dados na plataforma e sua verificação de conformidade.

“A inteligência artificial da Resultta indica, automaticamente, algumas inconsistências, mas os dados também são auditados por um técnico do programa, o mesmo que faz o treinamento dos produtores e tira suas dúvidas em tempo real”, explica Chaker. O zootecnista Rodrigo Gennari acompanhou sozinho as 107 fazendas da safra atual, que teve início dia 1º de julho de 2020 e se encerra dia 30 de junho de 2021. Outros quatro técnicos foram contratados para atender a safra 2021/2022. “Nosso trabalho começa após a inscrição dos produtores, que pode ser feita no site fazendanota10.com.br. Na sequência, a gente liga pra eles e verifica se cumprem os requisitos exigidos. Caso cumpram, explicamos como funciona o programa, ele assina o contrato e iniciamos o processo de treinamento para coleta/lançamento de dados na Resulta, curso que pode ser concluído em duas semanas. Depois, é só executar”, explica Gennari.

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“Recomendamos que os dados zootécnicos e financeiros sejam lançados semanalmente, para não acumular, mas o compromisso é mensal, ou seja, a fazenda tem de fechar o mês com todas as informações na plataforma”, acrescenta o zootecnista. Segundo ele, os produtores não têm tido dificuldades para cumprir essa tarefa. Além de alimentar a plataforma, eles devem participar, uma vez por mês, de uma masterclass (aula com um especialista em gestão), realizada ao vivo (como uma live), para que todos possam tirar suas dúvidas, trocar experiências e discutir questões gerenciais. O produtor também tem acesso a aulas gravadas e material técnico para download. Trimestralmente ele tem um balanço de resultados com geração de indicadores, para que possa checar suas metas e comparar-se com os Top 30 mais rentáveis.

“É nesse momento que se faz a chamada reunião do ‘taca-pedra’, nome dado por um fazendeiro à avaliação de resultados com a equipe. Discute-se, sem medo, porque determinada meta não foi cumprida, qual o caminho para melhorar etc. É um processo muito rico”, explica Chaker. Para encerrar o ciclo, tem-se o fechamento anual, com benchmarking. O Inttegra trabalha 130 métricas na pecuária de corte, mas foca em 10 indicadores: taxa de mortalidade, ganho médio diário, produção de @/ha, lotação (UA/ha), custeio cab/mês, desembolso cab/mês, desembolso por @ produzida, valor médio de venda, margem sobre a venda e resultado produtivo por hectare. Os mais importantes são os chamados indicadores de sucesso (receita/ha, por exemplo).

Fazenda São Camilo aumenta GMD

Participando do programa pela primeira vez nesta safra, já no formato exclusivamente on-line, Ana Paula Gouveia de Oliveira Santos e o marido, Raul Nunes Santos, estão muito satisfeitos com os avanços obtidos na gestão da Fazenda São Camilo, em Aparecida do Taboado, no Mato Grosso do Sul. “Tem sido muito bom, a gente tinha números, mas não gerava indicadores, nem conseguia fazer um raio-x do nosso negócio e identificar gargalos, como agora. No programa, esses números se correlacionam, apontam onde a gente está e onde pode chegar nossa lucratividade”, conta Ana Paula, que é responsável pelo lançamento dos dados.

Segundo a produtora, quando ela colocou a fazenda no programa, já definiu metas para vários indicadores, com base em seu diagnóstico (dados de 2019/2020). “Em pouco tempo, conseguimos atingir 40% de margem, como havíamos previsto, e melhoramos muito nosso ganho médio diário, que passou de 431 g para 731g/cab/dia”, revela Ana Paula, acrescentando que também tem tirado proveito das masterclass. “Elas me ajudaram muito na escolha de um novo gerente para a fazenda, pois os consultores da Inttegra ensinam como selecionar e contratar pessoas adequadas para cada situação. Estamos intensificando a fazenda e precisávamos de alguém aberto a tecnologias. Acabamos escolhendo um rapaz que nunca havia mexido com pecuária, era da área de energia. E deu muito certo”, conta a produtora.

A Fazenda São Camilo tem 357 ha e faz recria/engorda de machos em confinamento, parte próprios, parte adquiridos de terceiros, devendo abater 500 cabeças neste ano.

Fazenda Alegria reduz desembolso

A zootecnista Débora Thayana Freitas da Silva, responsável pela gestão do confinamento da Fazenda Alegria, em Pedra Preta (MT), pertencente ao produtor Milton Aguiar Ribeiro Neto, também tinha muitos dados em mãos, mas não sabia o que fazer com eles. “Faltava a análise de resultados para tomada de decisões e o Programa Fazenda Nota 10 nos deu isso, principalmente na parte financeira, porque o confinamento tem um software de gestão de índices zootécnicos”, explica Débora.

A propriedade também faz recria a pasto com suplementação, mas não tinha controle de dados nesse segmento. “Agora, sabemos exatamente quanto custa o animal que chega ao confinamento”, explica Débora, que destaca alguns números: “nosso desembolso reduziu de R$ 303,65 no primeiro trimestre para R$ 172,6 no terceiro; o GMD Global está em 1,09 kg/cab, a lotação em 4 UA/ha e a produção em 40@/ha”. Segundo ela, o programa trouxe muita informação importante para a fazenda. “Agora sabemos se é mais lucrativo comprar bezerro ou boi magro, por exemplo; temos condições de fazer um planejamento mais seguro”, garante.

Fazenda das Palmeiras se profissionaliza

Médico anestesista radicado no Rio de Janeiro, o produtor Antônio Campebell (75 anos) teve, por muito tempo, a Fazenda das Palmeiras, em Ituiutaba (MG), como hobby, mas, em 2020 resolveu profissionalizá-la, utilizando ferramentas modernas de gestão. “Eu não sabia quanto gastava, quanto produzia, levava a propriedade às cegas”, confessa. Em 2020, Campebell decidiu entrar no programa para mudar esse cenário e definir melhor seus investimentos, já que desejava intensificar a propriedade.

“Foi muito bom. Hoje, tenho todos os números na mão e observo nítida evolução nos resultados. O GMD, por exemplo, passou de 370 g para 697 g/cab/dia”, come[1]mora o produtor, cuja propriedade soma 980 ha, sendo 786 formados com pastagens, que já estão sendo redivididas para pastejo rotacionado, visando intensificação da recria, com direito a suplementação. Campebell diz que não teve dificuldades para compreender a metodologia do Instituto Inttegra. "Quem faz os lançamentos é minha secretária, mas acompanho tudo de perto", garante.

Fonte: Revista DBO

Autora: Maristela Franco

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